Retirada das faixas exclusivas de ônibus em Ribeirão Preto é retrocesso e prejudica os usuários do transporte coletivo

Divulgação RP Mobi

Retirada das faixas exclusivas de ônibus em Ribeirão Preto é retrocesso e prejudica os usuários do transporte coletivo

A decisão da prefeitura de eliminar as faixas exclusivas, transformando-as em preferenciais, se confirmado, representa engodo à população e ao governo federal, além de representar desrespeito à Lei 12.587/12, Lei Municipal nº 3.187/23 e ser um desperdício de dinheiro público


 

A cidade de Ribeirão Preto, principalmente os usuários do transporte coletivo, foi surpreendida pela notícia de que as faixas exclusivas de ônibus implantadas no Programa Ribeirão Mobilidade serão eliminadas[2]. O Programa é formado por obras de infraestrutura para o transporte coletivo, melhorias viárias e implantação de ciclovias[3]. Foram previstas intervenções em 11 corredores de ônibus, totalizando 56 quilômetros e 27 obras viárias. O investimento total se aproxima de R$ 500 milhões, sendo cerca de R$ 310.000.000,00 provenientes de recursos do Governo Federal, principalmente por meio do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, complementados pelo Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa) e outras agências de crédito.


A adoção de corredores e faixas exclusivas é uma medida adequada para priorizar a circulação dos ônibus, recomendada por toda a comunidade técnica do setor. Cabe lembrar a iniciativa pioneira de Curitiba, já na década de 1960 e os caos  recentes de São Paulo, Sorocaba, Campinas São José dos Campos, dentre outras cidades médias e grandes. Os principais benefícios desse tipo de infraestrutura é a redução do tempo de viagem, pois os ônibus não ficam presos no congestionamento causado pelos outros veículos, diminuição do consumo de combustíveis e, consequentemente, da emissão de poluentes locais e gases de efeito estufa. Com a melhoria da circulação do transporte coletivo há redução do tempo de viagem e ele passa a ser mais atrativo, principalmente se associado à renovação de frota e redução de custos para o usuário. A faixa e o corredor exclusivo servem para dar fluidez aos ônibus, principalmente no horário de pico. Dessa forma não veremos congestionamento de ônibus nas faixas, pois evitar esse problema é o objetivo do investimento. Por isso há a impressão de que elas estão vazias. A circulação dos ônibus em vias exclusivas permite a programação e o cumprimento de horários, possibilitando que o usuário faça a integração com previsibilidade e ganho de tempo.


Outro aspecto importante é que os investimentos em transporte coletivo são recomendados internacionalmente, dados os impactos positivos da sua existência para toda a cidade, e não apenas para seus usuários. O transporte coletivo é um serviço essencial e um Direito Social, conforme previsto na Constituição Federal de 1988. Outro aspecto fundamental é que ele é o único serviço de mobilidade urbana que pode ser universalizado em uma cidade. Essa característica decorre do fato de que nem todas as distâncias podem ser percorridas a pé ou de bicicleta, nem todos têm recursos para comprar uma motocicleta e muito menos um carro. Dessa forma, o transporte coletivo organizado em uma rede única e integrada é o único serviço que pode ser acessado por toda a população, tanto na área urbana quanto rural de uma cidade. O serviço também viabiliza o alcance de vários dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela ONU.


Os recursos do governo federal para a cidade de Ribeirão Preto, por meio do PAC, são destinados à melhoria do transporte público coletivo, favorecendo seus usuários. O financiamento está condicionado pela Lei nº 12.587/2012[4], que instituiu as Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, que prioriza os modos ativos (deslocamento a pé em curtas distâncias e o uso da bicicleta) e o transporte público coletivo como base do sistema de mobilidade urbana. As obras foram implementadas ao longo dos últimos anos, em conformidade com a Política e o Plano de Mobilidade de Ribeirão Preto, instituídos pela Lei Complementar nº 3.187/23[5].


A decisão da prefeitura de eliminar as faixas exclusivas, transformando-as em preferenciais, se confirmado, representa engodo à população e ao governo federal, além de representar desrespeito à Lei 12.587/12, Lei Municipal nº 3.187/23 e ser um desperdício de dinheiro público. Na prática, os recursos captados para melhorar a mobilidade urbana conforme as diretrizes da PNMU, serão usados para favorecer apenas o transporte individual, que passa a poder circular pelas vias destinadas ao transporte coletivo, prejudicando sua operação e, consequentemente seus usuários e os trabalhadores do setor. Outro aspecto importante é que a redução de custos proporcionados pelas faixas para o sistema é eliminada, o que representa aumento de subsídio público para cobrir a ineficiência causada pela própria prefeitura, mesmo depois de alto investimento público.


Os usuários do transporte coletivo formam uma parcela importante da população e merecem as melhorias da qualidade do serviço, redução de custos e nova frota. Mas muito se perde se as poucas vias destinadas ao transporte coletivo forem invadidas pelos carros e caminhões; e os ônibus ficarem parados nos congestionamentos. Será uma prova da iniquidade dos investimentos públicos que, na prática, são apropriados pelas parcelas de mais alta renda da população que usam carros, quando deveriam favorecer os usuários dos modos ativos e coletivos, que proporcionam melhor qualidade de vida para a cidade. É fundamental que as autoridades, o Ministério Público, as organizações da comunidade, associações de bairro, sindicatos de trabalhadores e a imprensa de Ribeirão Preto defendam os interesses dos usuários do transporte público coletivo, bem como o correto uso dos investimentos públicos que foram realizados em seu nome, reivindicando que a prefeitura mantenha as suas vias exclusivas e cumpra, assim, o que foi contratado e o que determina a Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana.


Renato Boareto[1]

Especialista em Planejamento e Gestão da Mobilidade Urbana

10 de julho de 2024


[1] Trabalha há mais de trinta anos com política pública de mobilidade urbana. Participou de várias administrações municipais e foi Diretor de Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades entre 2003 e 2008. É graduado em Gestão Ambiental, pós-graduado em gestão Pública e Mestre em Ciências Sociais na área de Estado, Governos e Políticas Públicas. Possui vários trabalhos publicados no Brasil e em outros países

[2] Faixas exclusivas de ônibus passam a ser preferenciais em 11 avenidas de Ribeirão Preto; veja quais. A Cidade On. Edição de 04 de julho de 2024. Disponível em https://www.acidadeon.com/ribeiraopreto/politica/faixas-exclusivas-de-onibus-passam-a-ser-preferenciais-em-11-avenidas-de-ribeirao-preto-veja-quais/

[3] TRANSERP. Apresentação do Programa Ribeirão Mobilidade.

 Disponível em https://www.ribeiraopreto.sp.gov.br/files/splan/planod/mobi-aud-tecnica-06-10.pdf

[4] BRASIL. Lei nº 12.587, de 02 de janeiro de 2012.Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12587.htm

[5] Cidade de Ribeirão Preto. Lei Complementar nº 3.187, de 03 de julho de 2023. Institui o Plano Municipal de Mobilidade Urbana de Ribeirão Preto - PLANMOB/RP 2022. Disponível em

https://publico.camararibeiraopreto.sp.gov.br/consultas/norma_juridica/norma_juridica_mostrar_proc?cod_norma=11760

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Renato Boareto é especialista em planejamento e gestão da mobilidade urbana Seja Companheiro, faça sua doação ao PT de Ribeirão Preto

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