Uma atuação classista e científica na eleição
foto: Filipe Peres
O período eleitoral brasileiro levanta muitas polêmicas
dentro da sociedade, sendo um momento de politização muito relevante. Apesar
disto, a burguesia busca por todos os meios possíveis transformar a eleição em
um grande circo. Logo, não é por acaso que vídeos como o bate-boca entre Maluf
e Covas sejam as lembranças que mais ficam na população.
A burguesia precisa que a eleição seja despolitizada e
despolarizada, pois mesmo tendo o monopólio dos meios de comunicação, seus
candidatos são amplamente detestados pela população. Mas, se esta é a estratégia da burguesia,
qual seria a nossa estratégia? Não cabe aqui a mim, teorizar coisa que já foram
ditas pelos mestres da luta dos povos oprimidos, apenas seguir disciplinadamente
o que historicamente funciona. Por isso, convido a todos para ler o capítulo 7
do livro “Esquerdismo, doença infantil do comunismo” em que Lênin faz
importantes ponderações sobre como se agir. O livro, escrito em 12 de maio de
1920, é uma obra-prima válida para os tempos atuais, que apenas aprofundaram o
estágio de degradação capitalista em que a economia é bancarizada,
financeirizada e monopolizada.
Os comunistas "de esquerda" alemães com o maior
desdém e a maior leviandade, respondem a essa pergunta pela negativa. Seus
argumentos? Na citação transcrita no parágrafo V pode-se ler:
"... rejeitar do modo mais categórico todo retorno aos métodos parlamentares de luta, que já caducaram histórica e politicamente..."
Além do tom ridiculamente presunçoso em que isso está dito,
sua falsidade é evidente. "Retorno" ao parlamentarismo! Já existe,
por acaso, uma república soviética na Alemanha? Então, como se pode falar de
"retorno"? Não é uma frase vazia?
O parlamentarismo "caducou historicamente". Isso
está certo do ponto de vista da propaganda. Mas ninguém ignora que daí à sua
superação na prática há 'uma enorme distância. Há muitas décadas já se podia
dizer, com toda razão, que o capitalismo havia "caducado
historicamente"; Mas isso nem mesmo impede que sejamos obrigados a
sustentar uma luta extremamente prolongada e tenaz no terreno do capitalismo. O
parlamentarismo "caducou historicamente" do ponto de vista
histórico-universal, isto é, a época do parlamentarismo burguês terminou,
começou a época da ditadura do proletariado. Isso é indiscutível. Na história
universal, porém, o tempo é contado por décadas. Nesse terreno, dez ou vinte
anos a mais ou a menos não tem importância; representam um número tão modesto
que, mesmo aproximadamente, é impossível aquilatar seu valor. Por isso,
utilizar-se do critério da história universal para uma questão de política
prática constitui o mais gritante erro teórico.
"Caducou politicamente o parlamentarismo"? Isto já
é outra questão. Se fosse verdade, a posição dos esquerdistas" seria
firme. Mas isso tem que ser provado através de uma análise muito séria, análise
que os esquerdistas nem sequer sabem como abordar. Do mesmo modo, não vale um
tostão, como veremos, a análise contida nas Teses Sobre o Parlamentarismo,
publicado no 19 número, do Boletim do Birô Provisório de Amsterdam da
Internacional Comunista (Bulletín of the Provisional Bureau in Amsterdam of
Communist International, February - 1920) e que exprime claramente as
tendências esquerdistas dos holandeses, ou as tendências holandesas dos
esquerdistas.
Em primeiro lugar, os "esquerdistas" alemães, como
se sabe, já consideravam em janeiro de 1919 que o parlamentarismo havia
"caducado politicamente", malgrado a opinião de destacados dirigentes
políticos como Rosa de Luxemburgo e Karl Liebknecht. É sabido que os
"esquerdistas" se equivocaram. Tal fato é suficiente para destruir de
golpe e radicalmente a tese de que o parlamentarismo "caducou
politicamente". Os "esquerdistas" tem a obrigação de demonstrar
por que seu erro indiscutível de então, deixou hoje de ser um erro. Contudo,
eles não apresentam, nem podem apresentar, a menor sombra de prova. A atitude
de um partido político diante de seus erros é um dos critérios mais importantes
e seguros para a apreciação da seriedade desse partido e do cumprimento efetivo
de seus deveres para com a sua classe e as massas trabalhadoras. Reconhecer
francamente os erros, pôr a nu as suas causas, analisar a situação que os
originou e discutir cuidadosamente os meios de corrigi-los é, o que caracteriza
um partido sério; nisso consiste o cumprimento de seus deveres; isso
significa-- educar e instruir a classe e, depois, as massas. Ao não cumprir
esse dever nem estudar com toda a atenção, zelo e prudência necessários seu
erro evidente, os "esquerdistas" da Alemanha (e da Holanda)
demonstram exatamente que não são o partido da classe, e sim um círculo; que
não são o partido das massas e sim um grupo de intelectuais e de um reduzido
número de operários que imitam os piores aspectos dos intelectualóides.
Em segundo lugar, no mesmo folheto do grupo "de
esquerda" de Francfort, do qual transcrevemos trechos mais detalhados
páginas atrás, lemos:
". . . os milhões de operários que ainda seguem a política do centro" (do partido católico- centrista) "são contrarrevolucionário. Os proletários do campo formam as legiões dos exércitos contrarrevolucionários". (página 3 do folheto em questão).
Como se vê, a afirmação é feita com ênfase e exagero
excessivo. Mas o fato fundamental exposto aqui é indiscutível, e seu reconhecimento
pelos "esquerdistas" atesta seu erro com acentuada evidência. Com
efeito, como se pode dizer que o "parlamentarismo caducou
politicamente", se "milhões" e "legiões" de
proletários ainda são não apenas partidários do parlamentarismo em geral, como,
inclusive, francamente "contrarrevolucionários"!? É evidente que o
parlamentarismo na Alemanha ainda não caducou politicamente. É evidente que os
"esquerdistas" da Alemanha consideraram seu desejo, suas concepções
político-ideológicas, uma realidade objetiva. Este é o mais perigoso dos erros
para os revolucionários. Na Rússia, onde o jugo sumamente selvagem e feroz do
czarismo criou, durante um período prolongadíssimo e com formas particularmente
variadas, revolucionários de todos os matizes, revolucionários de abnegação,
entusiasmo, heroísmo e força de vontade assombrosos, pudemos observar bem de
perto, estudar com singular atenção e conhecer minuciosamente este erro dos
revolucionários, o que nos faz vê-lo com particular clareza nos outros. Como é
natural, para os comunistas da Alemanha o parlamentarismo "caducou
politicamente"; mas, trata-se exatamente de não julgar que o caduco para
nós tenha caducado para a classe, para a massa. Mais uma vez, constatamos que
os "esquerdistas" não sabem raciocinar, não sabem conduzir-se como o
partido da classe, como o partido das massas. Vosso dever consiste em não
descer ao nível das massas, ao nível dos setores atrasados da classe. Isso não
se discute. Tendes a obrigação de dizer-lhes a amarga verdade: dizer-lhes que seus
preconceitos democrático-burgueses e parlamentares não passam disso:
preconceitos. Ao mesmo tempo, porém, deveis observar com serenidade o estado
real de consciência e de preparo de toda a classe (e não apenas de sua
vanguarda comunista), de toda a massa trabalhadora (e não apenas de seus
elementos avançados).
Mesmo que não fossem "milhões" e
"legiões", e sim uma simples minoria bastante considerável de
operários industriais que seguisse os padres católicos e de trabalhadores
agrícolas que seguisse os latifundiários e camponeses ricos (Grossbauern),
poderíamos assegurar sem, vacilar que o parlamentarismo na Alemanha ainda não
caducou politicamente, que a participação nas eleições parlamentares e na luta
através da, tribuna parlamentar são obrigatórias para o partido do proletariado
revolucionário, precisamente para educar os setores atrasados de sua classe,
precisamente para despertar e instruir a massa aldeã inculta, oprimida e
ignorante. Enquanto não tenhais força para dissolver o parlamento burguês e qualquer
outra organização reacionária, vossa obrigação é atuar no seio dessas
instituições, precisamente porque ainda há nelas operários embrutecidos pelo
clero e pela vida nos rincões: mais afastados do campo. Do contrário, correi o
risco de vos converter em simples charlatães.
Em terceiro lugar, os comunistas "de esquerda" são
pródigos de elogios a nós bolcheviques. Ás vezes dá-nos vontade de dizer-lhes:
louvem-nos menos e tratem de compreender melhor a nossa tática, familiarizar-se
mais com ela! Participamos das eleições ao parlamento burguês da Rússia, à Assembleia
Constituinte, em setembro-novembro de 1917. Era justa ou não a nossa tática? Se
não era, é preciso dize-lo com clareza o demonstrá-lo; isso é indispensável
para que o comunismo internacional elabore a tática justa. Se era, é preciso
tirar as conclusões que se impõem. Naturalmente, não se trata absolutamente de
equiparar as, condições da Rússia às da Europa Ocidental. Mas, quando se trata
em particular do significado que tem a ideia de que "o parlamentarismo
caducou politicamente", é indispensável levar em conta com exatidão a
nossa experiência, pois sem considerar uma experiência concreta, tais ideias
convertem-se muito facilmente em frases vazias. Nós, bolcheviques russos, não
tínhamos, porventura, em setembro-novembro de 1917, mais direito que todos os
comunistas do Ocidente de considerar que o parlamentarismo havia sido superado
politicamente na Rússia? Tínhamos, sem dúvida, pois a questão não se baseia em
se os parlamentos burgueses existem há muito ou há pouco tempo, mas sim em até
que ponto as massas trabalhadoras estão preparadas (ideológica, politicamente e
na prática) para adotar o regime soviético o dissolver (ou permitir a
dissolução) do parlamento democrático-burguês. Que a classe operária das
cidades, os soldados e os camponeses da Rússia estavam, em setembro-novembro de
1917, excepcionalmente preparados, em virtude de uma série de condições
particulares, para adotar o regime soviético e dissolver o parlamento burguês
mais democrático é um fato histórico absolutamente indiscutível e plenamente
demonstrado. Contudo, os bolcheviques não boicotaram a Assembleia Constituinte,
e sim, pelo contrário, participaram das eleições, tanto antes como depois da
conquista do Poder político pelo proletariado. Creio haver demonstrado no
artigo citado páginas atrás, no qual analiso minuciosamente os resultados das
eleições para a Assembleia Constituinte da Rússia, que essas eleições tiveram consequências
políticas de extraordinário valor (e de suma utilidade para o proletariado).
A conclusão que se tira desse fato é absolutamente
indiscutível: está provado que, mesmo algumas semanas antes da vitória da
República Soviética, mesmo depois dessa vitória, a participação num parlamento
democrático-burguês, longe de prejudicar o proletariado revolucionário,
permite-lhe demonstrar com maior facilidade às massas atrasadas a razão por que
semelhantes parlamentos devem ser dissolvidos, facilita o êxito de sua
dissolução, facilita a "supressão política" do parlamentarismo
burguês. Não levar em consideração essa experiência e pretender, ao mesmo
tempo, pertencer à Internacional Comunista - que deve elaborar
internacionalmente a sua tática (não uma tática estreita ou de caráter
estritamente nacional, mas exatamente uma tática internacional) - significa
incorrer no mais profundo dos erros e precisamente afastar-se de fato do
internacionalismo, embora este seja proclamado em palavras.
Consideremos agora os argumentos "esquerdistas
holandeses" em prol da não participação nos parlamentos. Eis a tese, a
mais importante das teses "holandesas" citadas anteriormente,
traduzida do inglês:
"Quando o sistema capitalista de produção é destroçado e a sociedade atravessa um período revolucionário, a ação parlamentar perde gradualmente seu valor em comparação com a ação das próprias massas. Quando, nestas condições, o parlamento se converte em centro e órgão da contrarrevolução e, por outro lado, a classe operária cria os instrumentos de seu Poder sob a forma dos Soviets, pode tornar-se inclusive necessário renunciar a toda participação na ação parlamentar"
A primeira frase é, evidente, falsa, posto que a ação das
massas - uma grande greve, por exemplo - é sempre mais importante que a ação
parlamentar, e não só durante a revolução ou numa situação revolucionária. Esse
argumento, de indubitável inconsistência e falso histórica e politicamente, só
serve para mostrar com particular evidência que seus defensores desprezam
completamente a experiência de toda a Europa (da França nas vésperas das revoluções
de 1848 e 1870, da Alemanha entre 1878 e 1890, etc.) e da Rússia (ver acima)
sobre a importância da combinação da luta legal com a ilegal. Essa questão é da
maior importância, tanto no geral como no particular, porque em todos os países
civilizados e adiantados aproxima-se a largas passadas a época em que tal
combinação será - e, em parte, já o é - cada vez mais obrigatória para o
partido do proletariado revolucionário, em consequência do amadurecimento e da
proximidade (1ª guerra civil do proletariado contra a burguesia, em consequência
das ferozes perseguições feitas aos comunistas pelos governos republicanos e,
de modo geral, burgueses, que violam por todos os meios a legalidade (como
exemplo disso basta citar os Estados Unidos), etc. Essa questão fundamental não
é absolutamente compreendida pelos holandeses e esquerdistas em geral.
A segunda frase é, em primeiro lugar, falsa historicamente.
Nós, bolcheviques, atuamos nos parlamentos mais contrarrevolucionários e a
experiência demonstrou que semelhante participação foi não só útil como
necessária para o partido do proletariado revolucionário, precisamente depois
da primeira revolução burguesa na Rússia (1905), a fim de preparar a segunda
revolução burguesa (fevereiro de 1917) e, logo em seguida, a, revolução
socialista (outubro de 1917), Em segundo lugar, essa frase é de um ilogismo
surpreendente. Da transformação do parlamento em órgão e centro (diga-se, de
passagem, que nunca foi nem pode ser realmente o "centro") da contrarrevolução
e da criação pelos operários dos instrumentos de seu Poder sob a forma de
Soviets conclui-se que os trabalhadores devem preparar-se ideológica, política
e tecnicamente para a luta dos Soviets contra o parlamento, para a dissolução
do parlamento pelos Soviets. Daí, porém, não se deduz de modo algum que essa
dissolução seja dificultada, ou não seja facilitada, pela presença de uma
oposição soviética dentro de um parlamento contrarrevolucionário. Nunca
dissemos, durante a nossa luta vitoriosa contra Denikin e Kolchak, que a existência de uma oposição
proletária, soviética, na zona ocupada por eles tenha sido indiferente para
nossos triunfos. Sabemos muito bem que a dissolução da Constituinte, por nós
efetuada a 5 de janeiro de 1918, longe de ser dificultada, foi facilitada pela
presença: na Constituinte contrarrevolucionária que dissolvíamos tanto de uma
oposição soviética consequente, a bolchevique, como de uma oposição soviética inconsequente,
a dos social-revolucionários de esquerda. Os autores da
tese confundiram-se totalmente e esqueceram a experiência de uma série de
revoluções, talvez até de todas, experiência que confirma a singular utilidade
que representa, por ocasião das revoluções, combinar a ação de massas fora do
parlamento reacionário com uma oposição simpatizante da revolução (ou, melhor
ainda, que a apoia, abertamente) dentro desse parlamento. Os holandeses e os "esquerdistas"
em geral raciocinam, nesse problema, como doutrinadores da revolução que nunca
participaram de uma revolução verdadeira, ou que nunca meditaram sobre a
história das revoluções, ou que ingenuamente tomam a negação subjetiva de uma
determinada instituição reacionária por sua efetiva destruição mediante o
conjunto de forças de uma série de fatores objetivos. O meio mais seguro de
desacreditar uma nova ideia política (e não somente uma ideia política) e
prejudicá-la consiste em levá-la ao absurdo, a pretexto de defendê-la, uma vez
que toda verdade, se a tornamos "exorbitante" (como dizia Dietzgen, pai), se a exageramos e a estendemos além
dos limites em que ela é realmente aplicável, pode ser levada ao absurdo e,
nessas condições, ela própria se transforma num absurdo. Eis o desserviço que
os esquerdistas da Holanda e da Alemanha prestam à nova verdade da
superioridade do Poder Soviético sobre os parlamentos democrático-burgueses.
Naturalmente, estaria errado quem continuasse sustentando, de modo geral, a
velha afirmação de que abster-se de participar dos parlamentos burgueses é
inadmissível em todas as circunstâncias. Não posso tentar formular aqui as
condições em que é útil o boicote, já que a finalidade desse folheto é bem mais
modesta: analisar a experiência russa em relação a algumas questões atuais da
tática comunista internacional. A experiência russa nos apresenta uma aplicação
feliz e acertada (1905) e outra equivocada (1906) do boicote por parte dos
bolcheviques. Analisando o primeiro caso, concluímos: os bolcheviques
conseguiram impedir a convocação do parlamento reacionário pelo Poder
reacionário, num- momento em que a ação revolucionária extraparlamentar das
massas (particularmente as greves) crescia com rapidez excepcional, em que não
havia nenhuma setor do proletariado e do campesinato que pudesse apoiar de modo
algum o Poder reacionário, em que a influência do proletariado revolucionário
sobre as grandes massas atrasadas estava assegurada pela luta grevista e pelo
movimento camponês. É totalmente evidente que esta experiência é inaplicável às
atuais condições europeias. Também salta aos olhos - em virtude dos argumentos
acima expostos - que a defesa, mesmo condicional, da renúncia à participação
nos parlamentos, feita pelos holandeses e pelos "esquerdistas" é
radicalmente falsa e nociva à causa do proletariado revolucionário.
Na Europa Ocidental e nos Estados Unidos o parlamento
tornou-se extremamente odioso para a vanguarda revolucionária da classe
operária Isso é indiscutível. E é facilmente compreensível, pois é difícil
imaginar maior vilania, abjeção e felonia que a conduta da imensa maioria dos
deputados socialistas e social-democratas no parlamento, durante e depois da
guerra. Contudo, deixar-se levar por esses sentimentos ao resolver a questão de
conto se deve lutar contra o mal universalmente reconhecido. Pode-se dizer que,
em muitos países da Europa Ocidental, o estado de espírito revolucionário ainda
é uma "novidade", uma "raridade" aguardada durante muito
tempo, em vão e impacientemente, razão por que, provavelmente, predomina com
tanta facilidade. E' claro que sem um estado de espírito revolucionário das
massas e sem condições que favoreçam o desenvolvimento desse sentimento, a
tática revolucionária não se transformará em ação; na Rússia, porém, uma
experiência bastante longa, dura e sangrenta convenceu-nos de que é impossível
levar em conta apenas o estado de espírito revolucionário para criar uma tática
revolucionária. A tática deva ser elaborada levando-se em consideração
serenamente, com estrita objetividade, todas as torças de classe do Estado em
questão (e dos Estados que o rodeiam, assim como de todos os Estados em escala
mundial) e também a experiência dos movimentos revolucionários. Manifestar o
revolucionarismo somente através de invectivas contra o oportunismo parlamentar, apenas condenando a
participação nos parlamentos, é facílimo; mas, exatamente por ser muito fácil,
não representa a solução para um problema difícil, dificílimo. Nos parlamentos
europeus é muito mais difícil que na Rússia criar uma fração parlamentar
realmente revolucionária. Sem dúvida. Isso, porém, não é senão uma expressão
parcial da verdade geral de que - na situação concreta de 1917,
extraordinariamente original do ponto dê vista histórico - foi fácil à Rússia
começar a revolução socialista; todavia, ser-lhe-á mais difícil que aos países
europeus continuá-la e concluí-la. Já no começo de 1918 tive de assinalar essa
circunstância, e a experiência dos dois anos decorridos desde então veio
confirmar inteiramente a justeza dessa consideração. Condições específicas
como: 1) a possibilidade de conjugar a revolução soviética com a cessação,
graças a ela, da guerra imperialista, que havia esgotado indescritivelmente os
operários e. camponeses; 2) a possibilidade de tirar proveito, durante certo
tempo, da luta mortal em que estavam empenhados os dois grupos mais poderosos
de tubarões imperialistas do mundo, grupos que não podiam unir-se contra o
inimigo soviético; 3) a possibilidade de suportar uma guerra civil
relativamente longa, em parte pela gigantesca extensão do país o pela
deficiência de suas comunicações; 4) a existência entre os camponeses de um
movimento revolucionário democrático-burguês tão profundo que o partido do
proletariado pôde tornar suas as reivindicações do partido dos camponeses (do
partido social-revolucionário, profundamente hostil, em sua maioria, ao
bolchevismo) e realizá-las imediatamente graças à conquista do Poder político
pelo proletariado - não existem hoje na Europa Ocidental. E a repetição dessas
condições ou de outras semelhantes não é nada fácil. Por isso, entre outras
razões, é mais difícil para a Europa Ocidental que para nós começar a Revolução
socialista. Tratar de "furtar-se" a essa dificuldade
"saltando" por cima do árduo problema de utilizar os parlamentos
reacionários para fins revolucionários é pura infantilidade. Quereis criar uma
sociedade nova e temeis a dificuldade de criar uma boa fração parlamentar de
comunistas convictos, abnegados e heroicos num parlamento revolucionário! Isso
não é, por acaso, uma infantilidade? Se Karl Liebknecht na Alemanha e Z. Höglund na Suécia souberam, mesmo sem o apoio,
vindo da base das massas, dar um exemplo de utilização realmente revolucionária
dos parlamentos revolucionários, como é possível que um partido revolucionário
de massas que cresce rapidamente não possa, em meio às desilusões o à ira do
após-guerra das massas, forjar uma fração comunista nos piores parlamentos?
Exatamente porque as massas atrasadas de operários e mais ainda - de pequenos
camponeses estão muito mais imbuídas de preconceitos democrático-burgueses e
parlamentaristas na Europa Ocidental que na Rússia, exatamente por isso,
somente no seio de instituições como os parlamentos burgueses os comunistas
podem (e devem) travar uma luta prolongada e tenaz, sem retroceder diante de
nenhuma dificuldade, para denunciar, desvanecer e superar tais preconceitos.
Os "esquerdistas" alemães queixam-se dos maus
"chefes" de seu partido e caem no desespero, chegando ao ridículo de
"negar" os "chefes". Porém, em circunstâncias que obrigam frequentemente
a mantê-los na clandestinidade, a formação de "chefes" bons, seguros,
provados é prestigiosos torna-se particularmente difícil e é impossível vencer
semelhantes dificuldades sem a combinação do trabalho legal com o ilegal, sem
fazer os "chefes" passarem, entre outras provas, também pela do
parlamento. A crítica - a mais implacável, violenta e intransigente - deve
dirigir-se não contra o parlamentarismo ou a ação parlamentar, mas sim contra
os chefes que não sabem - o mais ainda contra os que não querem - utilizar as
eleições e a tribuna parlamentares de modo revolucionário, comunista. Somente
essa crítica - ligada, naturalmente, à expulsão dos chefes incapazes e sua
substituição por outros mais capazes - constituirá um trabalho revolucionário
proveitoso e fecundo, que educará simultaneamente os "chefes", para
que sejam dignos da classe operária e das massas trabalhadoras, e as massas,
para que aprendam a orientar-se como é necessário na situação política e a
compreender as tarefas, amiúde bastante complexas e confusas, que dessa
situação decorrem.
Raphael Augusto Fresnedas, popularmente conhecido como Trena, é militante do Partido dos Trabalhadores (PT) em Ribeirão Preto. Exerce a profissão de professor como consequência da formação em ciências sociais na Unesp de Araraquara
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