Ana Perugini: Seu nome, sua identidade, seu direito

Desde que a Lei do Divórcio entrou em vigor, em 1977, a regra é que, em casos de separação judicial, a mulher ficasse com o sobrenome do ex-marido. Portanto, há quase 40 anos, a mulher divorciada tem o direito de manter o nome de casada.
O novo Código Civil, de 2002, reafirmou a igualdade entre homens e mulheres, assegurada na Constituição Federal de 1988. Atualmente, tanto o marido como a mulher podem adotar o sobrenome do outro. A possibilidade foi um passo muito importante para que iniciássemos a ruptura de hábitos paternalistas e a construção de uma sociedade sem disputa de gêneros e com relacionamentos mais equilibrados.
Além de estimular o desapego de uma formalidade inerente à sociedade patriarcal e machista em que vivemos, a legislação reforça o caráter personalíssimo do nome e demonstra sua importância na vida das pessoas. O nome é patrimônio pessoal, construído em anos de história e que carrega experiências que a lei já garante que sejam mantidas.
Mesmo assim, quando o casamento acaba, muitas mulheres são pressionadas pelos ex-maridos a retirarem o sobrenome. E a legislação tem se mostrado, na prática dos tribunais, confusa e cheia de lacunas. De acordo com o Código Civil, o cônjuge, seja ele marido ou mulher, pode ser obrigado a voltar a usar o nome de solteiro, se for considerado “culpado” pelo fim da união e haja exigência por parte do “inocente”.
No entanto, os adjetivos “culpado” e “inocente” abrem precedentes, levam a discussões subjetivas que acabam gerando constrangimentos às mulheres que contraíram matrimônio antes de o novo Código Civil entrar em vigor, em sua maioria uniões que duraram décadas.
Para garantir que o direito de manter o sobrenome do ex-cônjuge seja respeitado e para que a legislação fique mais clara e objetiva, estou elaborando um projeto de lei na Câmara dos Deputados. No texto, sugeri a substituição dos parâmetros “culpado” e “inocente” pelo critério de o cônjuge que queira ficar com o nome de casado só perder o direito – mediante ação e análise judicial – caso tenha cometido crime.
Acredito que é um critério concreto, justo e que contribuirá para a fácil distinção entre casos em que o originário do sobrenome possa, de fato, sofrer prejuízo e situações em que o pedido de retirada seja embasado em mero desejo pessoal que infrinja um direito fundamental.
A ideia de levar a proposta para discussão no Congresso Nacional surgiu durante um encontro de mulheres, em Hortolândia, município da Região Metropolitana de Campinas, onde percebi que muitas delas estão sofrendo com essa lacuna na legislação.
O que precisa ficar claro para a sociedade é que usar o nome de casado ou não – salvo situações em que o adotante tenha cometido algum tipo de delito – é prerrogativa do cônjuge.
O projeto de lei visa fortalecer ainda mais a igualdade entre homens e mulheres, direito que, como muitos outros assegurados na Constituição Federal de 1988, sucumbe às brechas existentes na legislação e ao desequilíbrio nas relações.
O nome é um direito, é identidade do indivíduo, seu endereço, carimbo, o que lhe identifica. É nome de seus filhos e de suas filhas. A mulher não pode ser obrigada a abrir mão de sua personalidade cada vez que um ciclo de sua vida for encerrado.
Como coordenadora-geral da Frente em Defesa dos Direitos Humanos das Mulheres no Congresso Nacional, vou lutar pela garantia jurídica que assegure a dignidade às mulheres que, em algum momento da vida, têm sua identidade questionada e seu direito ameaçado.
---Ana Perugini é deputada federal pelo PT/SP, coordenadora-geral da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos Humanos das Mulheres e 2ª vice-presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados.

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