A Autonomia do Banco Central

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A Autonomia do Banco Central

A independência do Banco Central representa, na prática, a privatização da política econômica, a sua captura pelo Itaú, Bradesco e Santander. Representa a impossibilidade de uma política industrial, de uma política de desenvolvimento, e sua reversão será extremamente custosa. Representa o enfraquecimento da já residual democracia

A grande imprensa, o governo, as federações de empresários, os partidos neoliberais (PSDB à frente), os bancos, as agências de risco etc. - isto é, as classes dominantes e todo o seu entulho político-ideológico - afirmavam, no já longínquo ano de 2017, que a destruição dos direitos trabalhistas através da chamada reforma traria mais crescimento e emprego. Em 2019, no trimestre encerrado em fevereiro, o desemprego atingiu mais 13 milhões de indivíduos. O número de trabalhadores subutilizados é de aproximadamente 28 milhões. E o daqueles que desistiram de procurar emprego, de 5 milhões. Tudo isso perfaz a espantosa cifra de aproximadamente 46 milhões de indivíduos – ou quase a metade da população economicamente ativa - em situação de precariedade.

 

Por sua vez, o crescimento do PIB em 2018, à despeito das previsões iniciais que variavam entre 2.5% e 3%, foi de 1,1%, isso após a contração de tempos de guerra de 2015 e 2016. Novamente, em 2019, os bancos etc. apostaram em um crescimento de mais de 2%. Entretanto, o Itaú divulgou na semana passada que sua previsão de crescimento é de 1,3%, e estamos apenas em meados de abril.   

 

A reforma trabalhista não resolveu quaisquer dos problemas que propôs solucionar, antes os agravou, ainda que não se tenha visto nem uma única autocrítica por parte de seus propositores.  

 

Consideremos outro aspecto. A indústria, ano após ano, vem reduzindo de tamanho. E os bancos, também ano após ano, vêm batendo os seus próprios recordes de lucros. Conforme divulgado pelo Banco Central, os bancos brasileiros lucraram quase R$ 100 bilhões em 2018.

 

A União gastou, no ano passado, com o pagamento de juros, R$ 342,67 bilhões (em 2016 e 2017, os números superaram os R$ 400 bilhões). Trata-se de montante superior ao total de gastos com saúde e educação no mesmo período. A título de comparação, o orçamento anual do Bolsa Família gira em torno dos R$ 30 bilhões.

 

Diante desse quadro, o governo Bolsonaro segue a mesma linha do governo Temer: se antes eram os direitos dos trabalhadores que impediam o crescimento, agora são as aposentadorias. A proposta apresentada por Bolsonaro desmonta o sistema público de seguridade social, joga os idosos na miséria – no Chile, onde foi implementado por Pinochet, há elevadas taxas de suicídio de idosos justamente por isso - e cria um gigantesco mercado aos bancos: o da capitalização. Esse sistema é tão bom para os aposentados que os militares exigiram não participar dele.

 

A reforma da previdência irá produzir tantos empregos e crescimento quanto aqueles produzidos pela reforma trabalhista!

 

Mas, ainda é pouco.

 

Na comemoração dos 100 dias de governo (comemorar o quê?), Bolsonaro apresentou outro conjunto de propostas, entre elas a da independência do Banco Central. Segundo o ministro da Casa Civil, o mandato do presidente do Banco será de 4 anos e não coincidirá com o do presidente da República.

 

Esse é o sonho da banca nacional e internacional há muito tempo. FHC tentou realizá-lo. A resistência impediu. Dessa vez, não chamou a atenção como deveria, como questão decisiva ao desenvolvimento. O volume de desatinos em voga serviu tem servido para dissolver outros tantos disparates.  

 

Trata-se da independência do Banco Central do poder eleito pelo povo e de sua absoluta dependência do poder – não eleito e contrário ao dos 99% da população - dos bancos privados.

 

É o Banco Central quem controla a taxa de juros, a política monetária e de câmbio e a regulação do sistema bancário. Que tal o seu banco decidir o juros que você paga? Ou ainda o câmbio, tendo em vista que os bancos ganham com as grandes oscilações? O câmbio define, por exemplo, o preço do pão, o dos remédios, do combustível e de praticamente todos os produtos. Quanto a regulamentação, a crise de 2008 já ensinou do que os bancos são capazes se não controlados.

 

A independência do Banco Central representa, na prática, a privatização da política econômica, a sua captura pelo Itaú, Bradesco e Santander. Representa a impossibilidade de uma política industrial, de uma política de desenvolvimento, e sua reversão será extremamente custosa.  Representa o enfraquecimento da já residual democracia.

 

Trata-se de mais um passo irresponsável e criminoso diante da grande finalidade política que é a construção nacional. Mas essa nunca foi a finalidade de nossas classes dominantes dependentes.

 

Mais dia, menos dia, o povo compreenderá. E então...

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Jorge Roque, cientista social, advogado trabalhista e mestre em Direito USP. Seja Companheiro, faça sua doação ao PT de Ribeirão Preto

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